Desde a pandemia de HIV, que assolou o mundo na década de 1980 e 1990, tornou-se praxe disponibilizar tratamentos e remédios experimentais (que ainda não foram totalmente aprovados pelas agências regulatórias) para pacientes em estado grave. Então por que a medicina não está fazendo o mesmo agora, autorizando terapias psicodélicas promissoras para pacientes com transtornos mentais? É isso o que defende um artigo publicado em julho de 2021, na Frontiers in Psychiatry, por Morgan Campbell, do departamento de psiquiatria do Delaware Division of Substance Abuse and Mental Health, e Monnica Williams, da Universidade de Ottawa.
Os autores argumentam que os pacientes de doenças mentais não são tratados da mesma forma que pacientes com outros males, como câncer ou doenças infecciosas. Para eles, não há justificativa ética para essa diferenciação. Se substâncias psicodélicas vêm mostrando resultados promissores em estudos ao redor do mundo, porque não podem ser ministradas para pessoas em estado grave de, digamos, depressão, ansiedade ou estresse pós-traumático?
Essa discussão se torna ainda mais importante no contexto atual. Como se sabe, juntamente com uma pandemia de Covid-19, o mundo está passando por desafios crescentes em saúde mental, oriundos do medo de adoecer, da insegurança econômica e do isolamento social. Segundo os autores, o número de americanos que reportaram sofrer de ansiedade e depressão saltou de 10% a 40% no último ano. Como justificar o não tratamento dessas pessoas?
O artigo relembra o caso do ativista Larry Kramer que, em 1988, depois de ver diversos amigos sucumbirem à Aids, denunciou o governo e as agências regulatórias americanas de estarem contribuindo para o aumento de mortes, ao negar o acesso de terapias novas aos pacientes com HIV. Para os autores, os argumentos incisivos de Kramer são válidos agora também, especialmente um: “Estamos no meio de uma p**** de uma peste!”, dizia ele. Quanto mais podemos esperar?