Depois de terem passado décadas de castigo nos laboratórios do mundo, as substâncias psicodélicas voltaram a ser estudadas – e foram recebidas com interesse por cientistas e psiquiatras. LSD, MDMA, psilocibina (a substância extraída dos popularmente conhecidos “cogumelos mágicos”) e outros estão chamando a atenção das comunidades científicas para tratar justamente aquelas doenças que a medicina tem penado para contornar: os distúrbios mentais – principalmente o estresse pós-traumático, a depressão e o vício.
A revista americana Cerebrum de janeiro de 2021 entrevistou especialistas do Imperial College London, da Universidade da Califórnia San Diego, da Universidade Columbia, entre outros para comentar os sucessos dos psicodélicos, suas possíveis atuações sobre o cérebro humano – e também dos cuidados que devem ser tomados em sua administração.
É compreensível a vontade de promover cada vez mais estudos com essas substâncias: os resultados são simplesmente encorajadores demais. Um teste conduzido pela Universidade Johns Hopkins, em que pacientes com casos de depressão grave receberam psilocibina juntamente com sessões de terapia, resultou em efeitos positivos “impressionantes” em 70% dos voluntários. Esse é um desempenho dificilmente alcançado por antidepressivos tradicionais.
O acúmulo de pesquisas também está jogando luz sobre outro imenso desafio da ciência: entender o funcionamento do cérebro humano. Ao analisar os efeitos dos psicodélicos sobre os nossos neurônios, cientistas esperam também entender a função de certas redes cerebrais, como as que regulam os sentidos e a memória.
Um exemplo é um outro experimento da Johns Hopkins, feito com DMT, uma substância presente na Ayahuasca, no qual os pacientes relataram ter se conectado com deuses, anjos, fantasmas e outros seres espirituais. Os voluntários que descreveram essa experiência em seguida sentiram efeitos positivos e duradouros sobre si mesmos, seus humores, a vida e as outras pessoas. Assim, resta a pergunta: quais áreas do cérebro estão relacionadas a essas sensações espirituais – e como elas podem ajudar a tratar pessoas com depressão, por exemplo?
Claro que é preciso cautela no meio de tantas novidades. Uma moda recente sendo aderida principalmente no Vale do Silício, na Califórnia, é a microdosagem: o consumo de psicodélicos em doses muito pequenas, que supostamente aumentariam a criatividade e a produtividade. Não existe, porém, nenhuma prova de que esse tipo de consumo possa gerar esse efeito – ou que ele sequer seja seguro. Um dos pesquisadores entrevistados pela Cerebrum sugere que as sensações descritas não passem de placebo.
Ainda assim – somando os efeitos possivelmente nocivos aos resultados promissores e aos relatos de um bem-estar tão profundo dos pacientes – os autores da Cerebrum defendem: fazer pesquisas sérias e cuidadosas com os psicodélicos se tornou uma obrigação moral para a ciência.