Instituto Phaneros

Psilocibina parece ter efeito positivo sobre a criatividade

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Em um estudo recente publicado na revista Translational Psychiatry, um grupo de cientistas da Universidade de Maastricht, na Holanda, demonstrou o efeito do uso da psilocibina, o princípio ativo dos famosos cogumelos mágicos, sobre o pensamento criativo dos participantes. 

Ao longo da história, existem diversos relatos individuais sobre o aumento da criatividade causada por psicodélicos, mas pouquíssimos experimentos controlados haviam sido feitos para testar essa hipótese. 

A pesquisa reforçou a ideia de que existem duas formas de manifestação da cognição criativa: a deliberada e a espontânea. A cognição criativa deliberada aparece quando alguém está focado em realizar um conjunto específico de passos, em uma situação guiada ou cronometrada (como, por exemplo, ao escrever uma redação ou inventar um prato de cozinha profissional.). Ela exige mais atenção do indivíduo, bem como mais racionalização e planejamento. 

Já a cognição criativa espontânea tende a ocorrer quando a atenção está mais desfocada, com pensamentos mais aleatórios, não filtrados – um estado mental supostamente mais semelhante ao estado psicodélico. 

Os dados da pesquisa parecem sugerir que a psilocibina foi capaz de aumentar agudamente o potencial para o pensamento criativo espontâneo, ao mesmo tempo em que diminuiu drasticamente o potencial para a cognição criativa deliberada, pelo menos na fase aguda do efeito da substância.

Atualmente, já se sabe que a criatividade costuma depender de um equilíbrio entre a cognição criativa deliberada e a espontânea e, nesse quesito, a psilocibina parece ter levado ainda mais vantagem. Durante a sessão psicodélica, a psilocibina interrompeu a interação entre essas duas cognições mas, depois de finalizada, esse equilíbrio foi restaurado. Isso se tornou evidente pelo número crescente de novas ideias que os participantes foram capazes de ter, uma semana após a sessão, ainda que quantidade de ideias não necessariamente se traduza em utilidade.

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Seria a microdosagem um tipo de fisiculturismo?

 

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A comparação acima, que a princípio parece sem pé nem cabeça, foi sugerida pelo sociólogo Dimitris Liokaftos, pesquisador da Liverpool John Moores University. Dimitris deu a declaração à revista Forbes em julho de 2021, em uma entrevista dedicada a entender o fenômeno da microdosagem  – um hábito que está se tornando moda entre profissionais de alto nível, especialmente do mundo das startups, no qual são ingeridas doses minúsculas de psicodélicos a fim de supostamente melhorar a performance, a criatividade e o desempenho no trabalho sem desencadear efeitos psicoativos notáveis. (Não há comprovação científica de que isso funcione, no entanto.)

Para o pesquisador, esse comportamento se parece com o fisiculturismo porque as duas práticas datam dos anos 1960 e 1970, e têm como objetivo explorar todo o potencial humano – ou seja, avançar além dos limites óbvios do corpo físico ou da mente. Os dois grupos de pessoas fazem isso por meio de drogas (no caso, esteroides e psicodélicos), que precisam ser tomadas de forma muito precisa e calculada para que se obtenha o resultado desejado. 

Tanto os microdosadores quanto os fisiculturistas propagandeiam que tomam apenas o mínimo necessário dessas substâncias para se beneficiarem delas – inclusive para não sofrerem com os efeitos negativos. Segundo Dimitris, ambos os grupos também são especialmente orgulhosos de sua prática e seus conhecimentos, reiterando como são especiais. Ambos também se sentem na vanguarda, como se estivessem em um ostracismo da sociedade, que não entende o que estão fazendo. 

Seja a comparação entre microdosadores e fisiculturistas válida ou não, uma das declarações que Dimitri deu à Forbes parece incontestável: “Nos anos 1960, os usuários de psicodélicos esperavam mudar um mundo profundamente injusto de uma maneira radical. Hoje em dia, quem faz microdosagem espera mudar a si mesmo a fim de atender às demandas de um mundo que segue sendo injusto. E essa, sim, é uma mudança enorme de perspectiva”.

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Uma breve história da psilocibina

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Um artigo publicado em maio de 2021 no Journal of Antibiotics pelo pesquisador David Nichols, da Universidade da Carolina do Norte, reconta a intrigante história dos cogumelos mágicos – de seu uso por sociedades pré-Colombianas à revolução psicodélica que vêm protagonizando nos últimos anos. 

Os primeiros registros do cogumelo no mundo ocidental foram feitos pelo frei franciscano espanhol ​​Bernardino de Sahagún que, em 1529, viajou para o México recém-invadido. Lá, ele entrou em contato com os astecas e passou mais de 50 anos estudando sua cultura – o idioma, os ritos e hábitos – e compilou tudo em uma obra de mais de 2400 páginas. Nelas, há a citação frequente a uma tal de “​​teonanacatl”: a “carne de deus” na língua asteca. Eram os cogumelos mágicos.

De acordo com o artigo, missionários espanhóis então passaram séculos tentando esconder a existência dos rituais  – com grande sucesso. Os cogumelos mágicos só voltaram a ser discutidos nos EUA já no século 20, quando exploradores descobriram os escritos do frei Bernardino e partiram para o México em busca da substância misteriosa. Na década de 1930, pesquisadores da Universidade Harvard tentaram levar os cogumelos para os EUA, e até participaram de rituais mexicanos. 

Foi apenas nos anos 1960, quando dois micólogos amadores chamados Valentina e Gordon Wasson, que também era banqueiro em NY, foram para Oaxaca juntamente com um fotojornalista da revista Life e registraram os ritos ancestrais, que o mundo parou para prestar atenção. A revista publicou as imagens das viagens psicodélicas, e mais e mais pessoas passaram a se interessar pelos cogumelos do gênero Psilocybe. Wasson mandou um exemplar para o químico suíco Albert Hofmann – e o resto é história. 

Hofmann notoriamente ingeriu os cogumelos por conta própria para comprovar seus efeitos psicodélicos e, então, passou a tentar isolar o componente ativo dos fungos. Como se sabe, ele foi bem-sucedido: nascia assim a psilocibina. E é ela – que já transformava sociedades milenares muito antes do Ocidente saber que havia continentes do outro lado do Atlântico – que agora parece estar revolucionando a forma como entendemos a mente humana.

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Revista Time elege tratamento psicodélico como uma das inovações mais importantes do último ano

 

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Em junho de 2021, a revista americana Time resolveu elaborar uma lista bem-humorada chamada “As 10 descobertas mais importantes da área da saúde que você perdeu por causa da pandemia”. Entre descobertas muito surpreendentes – como uma droga que aparentemente é eficaz para tratar obesidade, uma forma revolucionária de impedir que o mosquito Aedes aegypti transmita dengue, e até um embrião quimérico que mistura genes humanos com os de outros grandes primatas – estavam lá também os últimos avanços feitos com psicodélicos. 

O texto da Time:

“No ano passado, os psicoativos começaram realmente a se estabelecer como tratamentos de saúde mental de primeira linha. Em um estudo de abril, publicado no New England Journal of Medicine, 59 pacientes com depressão foram divididos em dois grupos: um recebeu psilocibina (princípio ativos dos cogumelos mágicos); o outro recebeu escitalopram (um inibidor de recaptação de serotonina já utilizado na psiquiatria há anos). Ambos receberam acompanhamento psicoterapêutico com o tratamento. Ao final do período de seis semanas de estudo, as pessoas do grupo da psilocibina tiveram melhor desempenho em uma auto-avaliação do que as que receberam o escitalopram – embora a diferença estatística fosse tímida. 

Em um estudo não relacionado, publicado na Nature Medicine em maio, 90 pessoas que sofriam de transtorno de estresse pós-traumático foram divididas de forma semelhante em dois grupos, um dos quais recebeu três doses de MDMA. O outro recebeu placebo. A conclusão: 67% das pessoas que haviam tomado MDMA não preenchiam mais os critérios para um diagnóstico de trauma, comparado com 32% do grupo de placebo. Múltiplas startups – incluindo Cybin com base no Canadá e Compass Pathway com base no Reino Unido – estão trabalhando para comercializar o uso de psicoativos para fins terapêuticos.”